A questão social vivenciada em nosso país expressa as desigualdades da contradição capital X trabalho, bem como é calcada na herança escravocrata que temos no Brasil.

Por Eriane Pacheco*

O Estado, através das políticas sociais, pode acelerar ou diminuir a desigualdade de gênero. Bem como a pressão dos movimentos sociais organizados tensionam, esse mesmo Estado, a construir alternativas e políticas públicas para a melhoria de vida de diversos segmentos da população. Símbolo disso são as lutas dos movimentos feministas, que vem pautando sistematicamente a interconexão entre gênero, raça e classe como processos interligados fundantes e mantenedores do capitalismo brasileiro.

Gênero é elemento estruturante das relações sociais em nossa sociedade e muitas vezes condicionante de desigualdade social. Como base analítica, gênero desvenda as desigualdades entre homens e mulheres situados como sujeitos numa ordem determinada pela produção, troca e consumo; e evidencia as dimensões simbólicas, normatizadas, e socializadas da produção de subjetividades.

O surgimento da Covid-19, como pandemia global, nos colocou em meio a uma crise sanitária e civilizatória de grandes proporções. Desde o início da pandemia, 7 milhões de mulheres deixaram o mercado de trabalho no Brasil. A taxa de desemprego entre as mulheres brasileiras foi de 14,5% no primeiro trimestre de 2020, 39,4% superior à taxa de desocupação de 10,4% dos homens. Na média global, a taxa de desemprego foi de 12,2% no primeiro trimestre, segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – Pnad Contínua (IBGE, 2020).

O isolamento social desnudou ainda mais a situação de violência que vivem as mulheres no Brasil. Houve um aumento de pelo menos 40% dos casos de violência doméstica (ONU, 2020). Em Porto Alegre, o monitoramento dos indicadores de violência contra as mulheres apresentado pelo Observatório de Segurança Pública do Rio Grande Do Sul em 2020, mostrou um aumento de 25% nos casos.

Ao analisarmos as condições de vida das mulheres, especialmente as mulheres negras, percebe-se uma precarização das condições de vida. São elas que enfrentam filas de madrugada nos hospitais públicos para levarem as crianças enfermas e, nas escolas, em busca de vagas; entretanto, muitas delas não chegam à previdência, sejam por serem as que mais se encontram na informalidade, nos empregos mais precarizados sem direitos trabalhistas assegurados, seja por não terem sequer documentos pessoais, especialmente as que residem em áreas rurais.

Apesar da manutenção desses padrões de desigualdade que hierarquizam os gêneros, promovem a violência e mantém a disparidade salarial, há uma crescente presença feminina nas lutas políticas e sociais. Os movimentos sociais conduzidos por lideranças do PCdoB têm conduzido a luta das mulheres em cada território. Partimos de uma política que considera o mundo privado, e de outro propomos soluções e alternativas baseadas no compartilhamento de saberes e soluções.

Em decorrência de que a desigualdade de gênero, o racismo e a opressão de classe são elementos formadores da sociedade brasileira que se entrelaçam, a nossa luta feminista representa uma contestação ao sistema capitalista brasileiro, ao patriarcado e ao racismo que nele se reproduzem. A luta feminista e antirracista vem se manifestando com força na sociedade brasileira. Essas lutas, que se desenvolvem no cotidiano, fazem parte das expressões da questão social e resistência que compõem nossa atual conjuntura. 

O feminismo é um movimento político que busca subverter as relações desiguais do poder historicamente constituídas. Em decorrência de que a desigualdade de gênero, o racismo e a opressão de classe são elementos formadores da sociedade brasileira que se entrelaçam, a luta feminista representa uma contestação ao sistema capitalista brasileiro e ao patriarcado que nele se reproduz.

Afirmando que seu corpo é também um território de direitos, as mulheres colocam no alto de sua agenda o direito à sua autonomia, sua diversidade  e integridade no contexto da luta pelo fim de todas as formas de violência como uma pré-condição a uma vida digna. Precisamos estar lado a lado com essas mulheres e por diversas vezes contribuir para a condução de sua luta.

As mulheres da América Latina se levantam! A aprovação do Projeto de Lei de Interrupção Voluntária da Gravidez foi ecoada pelo movimento feminista em toda América Latina, onde a massiva mobilização empreendida pelas militantes da Argentina é acompanhada, há anos, com admiração e esperança. Nós, brasileiras, sabemos que temos um longo caminho, mas a esperança e a experiência argentina nos trazem luz para uma América Latina livre, feminista e com igualdade.

No Brasil, nos levantamos no meio da pandemia por justiça por Mari Ferrer (mulher estuprada, tendo em sua audiência uma outra forma de violência psicológica), bem como participamos ativamente das eleições em todo país, tendo o maior número da história de mulheres disputando as eleições.

São inúmeros os desafios que enfrentamos na questão de gênero em nosso país e essa, mais do que nunca, se tornou uma agenda fundamental na busca de uma sociedade igualitária, tarefa que deve ser tratada com centralidade pelo coletivo partidário.

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*Eriane Pacheco é secretária de Mulheres do PCdoB-RS. Mestranda em Política Social e Serviço Social UFRGS e chefa de gabinete da Vereadora Bruna Rodrigues (PCdoB-RS)

(BL)

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