Não é novidade nenhuma dizer que o movimento comunista se envolve com a questão da emancipação das mulheres. Apesar do machismo que predominava em boa parte da esquerda da época, visível sobretudo em Proudhon (considerado o pai do anarquismo), ainda em 1844, nos Manuscritos Econômico-Filosóficos, Marx já escreve:
“A relação imediata, natural, necessária, do homem com o homem é a relação do homem com a mulher. (…). A partir desta relação pode-se julgar, portanto, o completo nível de formação do homem.” (Marx, 2004, p. 104).
Por Erik de Souza*
Prosseguindo, o comunista brasileiro Augusto Buonicore, identifica que nessa época Marx e Engels já haviam assimilado a ideia do socialista utópico Fourier de que “o grau de emancipação da mulher é a medida natural do grau de emancipação geral”. No século seguinte, essas ideias emancipatórias ganham força com a contribuição de marxistas como Lênin, Clara Zetkin, Alexandra Kollontai e outros. Apesar de retrocessos em alguns países, sobretudo na URSS durante o período pré-segunda guerra, é seguro afirmar que o movimento revolucionário comunista se empenhou na superação da sociedade patriarcal e machista que ainda hoje impera no mundo.
Aqui no Brasil, as mulheres do Partido Comunista do Brasil (na época PCB) empenharam-se na construção da Federação Brasileira de Mulheres, em 1949, e lançaram o periódico Movimento Feminino. Mas quero destacar outro acontecimento, que considero de maior relevância: o lançamento do informe político “A Luta pela Emancipação da Mulher”, no VI congresso do PCdoB. É comumente dito que esse documento fundamentou o chamado feminismo emancipacionista, influenciando ainda na criação da União Brasileira de Mulheres (UBM) no ano de 1988.
Importante ainda ressaltar que o VI congresso ocorreu na Albânia. Pequeno país europeu, na Albânia pré-revolucionária, a mulher era considerada uma “criatura de segunda categoria” e por vezes tratada como propriedade. Após a entrada dos comunistas no poder, foi executada uma verdadeira revolução cultural no país, com Enver Hoxha afirmando que “o Partido e o país inteiro deveriam arremessar ao fogo e quebrar o pescoço de qualquer pessoa que ousasse violar o sagrado decreto do partido em defesa dos direitos das mulheres”. Não acredito que seja mera coincidência que o PC do Brasil tenha passado a desenvolver melhor as questões de gênero justamente na época em que estava mais próximo do chamado “farol albanês”.
Nas décadas seguintes os comunistas do Brasil avançaram imensamente na luta emancipatória, liderados por grandes personalidades políticas como a ex-deputada Jô Moraes, membra do comitê central do partido desde 1981. Essa liderança culmina no momento atual, onde o partido possui Luciana Santos como presidenta nacional e teve a gaúcha Manuela d’Ávila como pré-candidata à presidência da república em 2017-2018. Manuela foi a primeira pré-candidata presidencial do partido desde 1945 e é, sem dúvidas, a pessoa mais preparada para representar a nível nacional o projeto eleitoral dos comunistas.
Nessas últimas décadas, a concepção emancipatória do feminismo e do marxismo, que merece destaque por ser a primeira abertamente marxista-leninista, evoluiu, cresceu. Destaco aqui a necessidade pendente de se sistematizar essas ideias, ressaltando as seguintes bases teóricas:
a) As contribuições de autores e autoras considerados “clássicos” do marxismo-leninismo, como Marx, Engels, Lênin, Clara Zetkin, Alexandra Kollontai, Nadejda Krupskaia, entre outros;
b) As contribuições um pouco mais recentes de autoras feministas (leninistas ou não), como Angela Davis, Simone de Beauvoir, Nancy Fraser, entre outras;
c) As contribuições do PCdoB, sobretudo de autoras como Ana Rocha, Loreta Valadares, Liége Rocha, Jô Moraes, entre outras.
É de comum conhecimento entre os marxistas-leninistas que Stálin erigiu e sistematizou a obra de Lênin, em especial em obras como ‘Sobre os Fundamentos do Leninismo e Em Torno dos Problemas do Leninismo’, assim como Lênin erigira e sistematizara (com maior rigor teórico) as obras de Marx e Engels. Dessa forma, digo que é um erro tremendo querermos nos distanciar da tarefa de dedicar mais esforço na sistematização dessa concepção original e revolucionária que é o feminismo emancipacionista; destacando ainda que sistematização deve significar a clarificação e o ordenamento dessas ideias, evitando ao máximo a simplificação. É possível inclusive afirmar que esse trabalho já começou com o dossiê de ‘Estudos Estratégicos – Emancipação da Mulher’, elaborado pela comunista Ana Rocha.
Por fim, cito João Amazonas:
“Cuidar do Partido sempre foi preocupação constante dos revolucionários proletários. Nos dias de hoje, essa preocupação deve ser ainda maior porque, na avaliação da luta secular pelo socialismo, evidencia-se que no Partido reside o fator determinante dos sucessos ou dos fracassos da Revolução e da edificação socialista.” (Amazonas, 2005, p. 39).
Sem sombra de dúvidas, o maior estudo da emancipação das mulheres é um dos fatores determinantes para o sucesso revolucionário do Partido Comunista do Brasil. Vamos construir nosso Partido fazendo a defesa intransigente da luta emancipacionista, justa e revolucionária.
Referências:
AMAZONAS, João. Os Desafios do Socialismo no Século XXI. São Paulo: Editora Anita Garibaldi, 2ª Edição, 2005.
BUONICORE, Augusto. As Mulheres e a Luta Socialista. 2007.
MARX, Karl. Manuscritos Econômico-Filosóficos. São Paulo: Boitempo, 2010.
MORAES, João Quartim de. A Influência do Leninismo de Stálin no Comunismo Brasileiro. In: MORAES, João Quartim de; REIS, Daniel Aarão. História do Marxismo no Brasil. Campinas: Editora da Unicamp, 2007.
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Erik de Souza* é estudante secundarista, diretor de formação da União da Juventude Socialista (UJS) e secretário de comunicação do PCdoB em Seropédica/RJ.
(BL)