As dificuldades enfrentadas pelas mulheres durante a gravidez, parto e o puerpério ainda figuram entre os principais reflexos da desigualdade social e pioraram com a pandemia. Conforme apontou a Organização Mundial de Saúde (OMS), a mortalidade materna é inaceitavelmente alta e boa parte poderia ser evitada. Somente em 2020, 287 mil mulheres perderam a vida nesse período em todo o mundo, sendo 95% em países de baixa e média renda.
A OMS aponta que “o alto número de mortes maternas em algumas áreas do mundo reflete as desigualdades no acesso a serviços de saúde de qualidade e destaca o fosso entre ricos e pobres”. Ressalta, ainda, que “cenários humanitários, de conflito e pós-conflito impedem o progresso na redução da carga da mortalidade materna”.
Como reflexo dessa realidade, nos países da América Latina e do Caribe, a mortalidade materna aumentou em 15% entre 2016 e 2020, com 8.400 mortes de mulheres a cada ano. De acordo com a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), tal situação é “um retrocesso de 20 anos na saúde materna na região”, após uma redução de 16,4% entre 1990 e 2015. De acordo com a entidade, a meta é alcançar menos de 30 mortes maternas por 100 mil nascidos vivos, mas hoje esse índice é mais do que o dobro, 68.
No Brasil, este domingo (28) marcou o Dia Nacional de Redução da Mortalidade Materna, dedicado à conscientização sobre o tema. De acordo com o Ministério da Saúde, em 2020, 71.879 mulheres morreram durante a gravidez, o parto ou puerpério. Em 2022, dados preliminares mostram que foram 66.862 mortes maternas. E, de acordo com o Observatório Obstétrico Brasileiro, ao menos 1.518 gestantes morreram devido ao coronavírus somente em 2021.
Quando analisado o quadro a partir da incidência da Covid-19 no país, a Fiocruz aponta que em 2020 houve alta de 40% no número de mortes maternas na comparação com anos anteriores e, mesmo considerando a expectativa de aumento das mortes em geral em decorrência da pandemia, ainda assim houve um excesso de 14%.
E nesse quadro dramático, os atrasos e omissões do governo Bolsonaro, sobretudo quanto à aquisição da vacina, contribuíram diretamente para agravar a situação. A Fiocruz também verificou que as chances de hospitalização de gestantes com diagnóstico da doença foram 337% maiores. Para as internações em UTI, as chances foram 73% maiores e o uso de suporte ventilatório invasivo 64% acima em relação aos demais pacientes com covid-19, que morreram em 2020.
“A infecção pela Covid-19 em gestantes e puérperas está associada ao aumento da mortalidade materna. Por isso, a vacina é essencial, protege a mãe e transfere anticorpos para o bebê”, afirmou o diretor do Programa Nacional de Imunizações (PNI), Éder Gatti.
Com a melhora do quadro da pandemia no Brasil, o Observatório Obstétrico Brasileiro aponta como causas de mortes de mães e puérperas s hipertensão, seguida por hemorragia e infecção — 90% dessas mortes poderiam ter sido evitadas, segundo especialistas da área, o que reforça a importância de políticas públicas e acesso ao pré-natal.
Programas como o Rede Cegonha, do Ministério da Saúde, viabilizado em parceria com estados e municípios, atua no sentido de reduzir tanto o índice de mortalidade materna com infantil.
Após a quebradeira dos últimos anos, o Ministério da Saúde explica que tem buscado, sob o governo Lula, “revisar as políticas, normas e documentos técnicos referentes à Rede, apoiar estados e municípios e retomar o diálogo interfederativo para avançar na organização da rede assistencial, estabelecer parcerias para capacitação de profissionais para assistência qualificada e reativar o Comitê Nacional e Comitês temáticos estaduais”.
Como a questão está diretamente envolvida com a desigualdade social, políticas que caminhem neste sentido também impactam na melhora desses índice.
Segundo o Centro de Integração de Dados e Conhecimento para Saúde (Cidacs/Fiocruz Bahia), as mulheres que até o dia do parto tinham entre um e quatro anos recebendo Bolsa Família tiveram taxa de proteção de 15 % para morte materna, já aquelas cobertas entre cinco e oito anos tiveram um fator de proteção de 30%. Para chegar a essa conclusão, foram analisados a situação de mais de 7,9 milhões de brasileiras que tiveram um parto entre 2004 e 2015.
Por Priscila Lobregate, com Agências