O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou, nesta quarta-feira (31), a lei que institui uma pensão especial para os filhos e dependentes, menores de 18 anos, de mulheres vítimas de feminicídio, resultante de projeto de autoria da deputada federal Maria do Rosário (PT-RS). Na cerimônia, Lula classificou esse tipo de crime como abominável e defendeu a educação, desde a infância, para o desenvolvimento de comportamentos fraternos e solidários.
Lula disse que sanciona a lei “com tristeza”, por saber que se trata de uma pensão a crianças que perderam suas mães de maneira violenta, por um ato que, na maioria das vezes, pode ter o próprio pai como autor. O presidente destacou que é necessário os homens se perguntarem o que os leva a serem “tão baixos e rasteiros” e agredir suas companheiras. “Não tem explicação”, pontuou.
O presidente lamentou o fato de que esse tipo de crime esteja aumentando e lembrou que ao sancionar a Lei Maria da Penha, acreditava que a violência contra as mulheres diminuiria. E declarou que “um casal, quando tem algum problema, alguma desavença, deve se sentar à mesa, conversar, discutir, agora não é possível chegar às vias de fato por divergência, por ciúmes”.
Segundo dados do Anuário 2023 do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os registros de feminicídios cresceram 6% em 2022, resultando em 1.437 mulheres assassinadas, das quais 61% são negras. Ao todo, 2.321 crianças e adolescentes perderam suas mães dessa forma; isso significa que em média seis ficam órfãos no Brasil, por dia, em razão desse crime.
Com relação à formação de cidadãos que respeitem os direitos das mulheres, o presidente defendeu: “É preciso que a gente encontre um jeito para que, a partir da escola, da creche, a gente comece a educar nossos filhos de que é muito melhor para a humanidade eles serem bons, fraternos, solidários, amorosos com suas companheiras e aprenderem a viver em amor”.
Lula também aproveitou a oportunidade para renovar seu apelo pela paz no conflito entre Israel e Hamas, citando o alto número vítimas entre crianças e adolescentes. “Estamos vendo pela primeira vez uma guerra em que a maioria dos mortos é criança. E ninguém tem responsabilidade. A gente não consegue fazer uma carta da ONU convencendo as pessoas que estão guerreando de que assim não é possível, que parem. Pelo amor de Deus, parem”.
Segundo dados mais recentes do Ministério de Saúde de Gaza 3.542 crianças foram mortas no território. Além disso, 37 teriam sido mortas na Cisjordânia e 30 em Israel, de acordo com a Unicef.
Futuro roubado
A ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, apontou que “o feminicídio é o ato mais extremo de um contínuo de violências que, de forma cruel, afetam cotidianamente as mulheres. É fruto da perpetuação de relações desiguais de poder, da subjugação das mulheres e do silêncio da sociedade. A violência doméstica e familiar contra as mulheres é, sem dúvida, uma das maiores questões sociais que o Brasil enfrenta e seus efeitos seguem, em grande medida, subestimados e invisibilizados em diferentes setores sociais”.
Neste sentido, destacou, “a sanção presidencial de hoje assinala que este governo — sob orientação do presidente Lula, com a coordenação do Ministério das Mulheres e o apoio de todas as ministras e ministros —, reconhece o feminicídio como grave fenômeno social e reafirma a necessidade de desenvolvermos políticas específicas voltadas às mulheres brasileiras e aos adolescentes e crianças em razão dessas mortes violentas. Se (essas mortes) são evitáveis, nos caberá evitá-las”.
Conforme estabelece a nova lei, o benefício, no valor de até um salário mínimo, será concedido aos órfãos cuja renda familiar mensal per capita seja de até 25% do salário mínimo. A pensão instituída alcança crianças e adolescentes dentro das regras estabelecidas, mesmo que o feminicídio tenha ocorrido anteriormente à publicação da lei.
De acordo com o governo, lei consiste em medida de caráter reparatório às vítimas diretas e indiretas da violência de gênero, contemplando ações previstas no eixo de prevenção terciária do Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios, instituído em agosto deste ano por meio do Decreto 11.640/2023.
Para a autora da medida, a deputada Maria do Rosário, “quando o feminicídio acontece e desta criança é roubada a mãe, também lhe é roubada a possibilidade de crescer num ambiente de aconchego, com a proteção de um pai, ou cuidador, dado que, no caso do Brasil, em 96% dos casos, há o envolvimento direto com autor do crime contra essa mulher”.
Ela reforçou que trata-se de uma lei sobre direitos humanos, sobre crianças, sobre mulheres. “Nos dói falar sobre estes temas, mas sobretudo, nós queremos que a violência não ocorra e queremos dizer às crianças, filhos e filhas do Brasil, que podem contar com o que diz o hino brasileiro, na estrofe ‘mãe gentil’— certamente, isso pode se desdobrar em realidade, em cuidado e atenção a cada um e cada uma”, concluiu.
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por Priscila Lobregatte