Duas Propostas de Emenda à Constituição (PECs) e um Projeto de Lei tramitam na Câmara dos Deputados propondo a redução da jornada semanal de trabalho. O tema interessa aos trabalhadores em geral, especialmente às mulheres, mais impactadas pela escala de trabalho 6×1 – regime de seis dias de trabalho para um de descanso. 

O regime atual intensifica as desigualdades de gênero e representa riscos à saúde das mulheres submetidas à sobrecarga, decorrente do acúmulo de uma jornada de trabalho remunerado exaustiva aliada ao trabalho não remunerado.

As mulheres gastam 21 dias a mais do que os homens em tarefas domésticas, o equivalente a 499 horas a mais de trabalho. No período de um ano, os homens dedicam 612 horas aos afazeres domésticos, enquanto as mulheres 1.111 horas, segundo dados de 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístico (IBGE).

Para a economista Ana Georgina Dias, Supervisora Técnica Regional do Dieese, na Bahia, a escala 6×1 tem um impacto perverso na vida das mulheres.

“Elas dedicam muito tempo das suas vidas ao trabalho não remunerado doméstico, ao cuidado com a família. Essa jornada (6×1) é extremamente extenuante. O único dia de folga pode ser qualquer dia da semana.  Além da dupla jornada, a gente ainda tem que considerar os longos períodos de trajeto de casa para o trabalho, a dificuldade de mobilidade urbana. Isso caba tendo um efeito danoso na saúde da mulher, principalmente na saúde mental”, diz.

A escala 6×1 é comum principalmente em funções como telemarketing e no comércio, setores com presença expressiva de mulheres. Com o tempo livre limitado, não sobra espaço para as atividades de lazer e nem para a qualificação profissional e o desenvolvimento pessoal.

Os fatores negativos impostos pela escala 6×1, acrescidos do acúmulo de trabalho não remunerado, são potencializados quando se faz um recorte racial. “O mercado de trabalho é hostil para todos, mas especialmente para as mulheres e mais ainda para as mulheres negras, que na sua maioria ocupa as funções mais precarizadas”, ressalta Ana Georgina Dias.

Equidade de gênero

A redução da jornada é considerada essencial para a melhoria da qualidade de vida das trabalhadoras e uma maior inserção das mulheres no mundo do trabalho, em condições mais igualitárias. “Muito complicado pensarmos em equidade de gênero sem pensarmos numa inserção feminina no mercado de trabalho em condições mais igualitárias com os homens”, pontua Dias.

Além da redução da jornada, a luta das mulheres passa também por novas configurações na divisão sexual do trabalho, que resulta de uma construção cultural e histórica de sociedades patricarcais, que atribuem às mulheres a responsabilidade pelo cuidado com a família e afazeres domésticos. “A divisão sexual do trabalho tal como está posta acaba penalizando as mulheres com a dupla jornada”.

A divisão sexual do trabalho influencia também no mundo do trabalho formal. Não por acaso, as mulheres são maioria nos trabalhos que envolvem cuidado. Entre os trabalhadores domésticos, as mulheres representam 86% da categoria, mesmo percentual entre os docentes da educação básica. No setor de Saúde, elas também são maioria, com presença majoritária na enfermagem. “As áreas que mais empregam mulheres, são áreas que na verdade são quase uma extensão das tarefas de cuidado”.

PECs e Projeto de Lei

Duas Propostas de Emenda à Constituição (PECs) estão em tramitação no Congresso Nacional. A mais recente, a PEC 8/25, de autoria da deputada Érica Hilton (PSOL-SP) propõe a redução da jornada 6×1 para 4×3 (quatro dias de trabalho para três de descanso), respeitando a carga horária de 8 horas diárias. A PEC começou a tramitar, após a deputada conseguir a assinatura de 171 parlamentares.

Outra proposta mais antiga, a PEC 221/2019, de autoria do deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) propõe a redução gradual da jornada, ao longo de dez anos, de 44 horas para 36 horas semanais, sem redução de salário. A PEC foi protocolada com mais de 234 assinaturas.

Antes da aprovação, uma PEC percorre um longo caminho. Primeiro, é necessário passar pela Comissão de Constituição e Justiça. Depois, deve ser submetida a uma Comissão Especial para aprofundar os estudos e, em caso de aprovação, submissão à votação em dois turnos, no Plenário da Câmara Federal. Caso seja aprovada, a PEC segue para o Senado Federal, onde vai passar por etapas semelhantes. Após aprovação nas duas casas, a PEC é encaminhada para sanção presidencial.

Em paralelo à tramitação das PECs, tramita também na Câmara Federal o Projeto de Lei 67/2025 de autoria da deputada Daiana Santos (PCdoB-RS), que propõe a alteração da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e da Lei nº 12.790/13, que regulamenta a profissão de comerciário. O Projeto de Lei propõe a redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais, com dois dias de repouso remunerado.

A deputada está otimista com o avanço da matéria. Segundo Daiana Santos, a redução da jornada vai colocar o Brasil no mesmo patamar da maioria dos países do G20, que reúne as 20 maiores economias do mundo. Com a jornada média atual de 39 horas, o país ocupa a 11ª posição, mas se considerarmos a jornada de 44 horas semanais, o país cai para a 18ª posição.

Nesse cenário, a redução da jornada normal máxima semanal é uma medida essencial para alinhar o Brasil a outros países em situação econômica similar, garantindo, assim, maior qualidade de vida para o trabalhador, que terá mais tempo livre para lazer, estudo e convívio familiar e social”, diz Daiana em entrevista ao Portal Vermelho.

Da Redação

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