Apesar do entrelaçamento das lutas de classe, gênero e raça não ser uma novidade no PCdoB, o destaque com que ele se apresenta no documento-base da 3ª conferência nacional sobre a emancipação das mulheres (3CNEM) pode ser considerado um marco na história do partido. Há vários, mas dois elementos nos ajudam a ilustrar isto de forma muito simbólica e valiosa.

Por Harlen Oliveira Cunha*

O primeiro é que, pela primeira vez, a expressão mulher negra aparece num documento de conferência do PCdoB sobre as mulheres. Provavelmente seja inédito também entre todos os documentos partidários que foram aprovados pelo nosso Comitê Central. Isto não é uma questão menor. Trata-se de um ser que estava invisível em meio à nossa então insistência de falar das mulheres como universais.

O segundo é o referencial bibliográfico. O texto da 2CNEM traz, no seu final, as referências bibliográficas. Nenhum autor negro ou autora negra. No entanto, no documento da 3CNEM e nos dias atuais, são nítidas as influências e são recorrentes as citações de Ângela de Davis, Lélia Gonzalez e Sueli Carneiro, por exemplo.

Isto tem relação com a grandeza do PCdoB, que se desenvolve enriquecendo-se, mas também se relaciona com o contexto de ascensão das lutas feministas e antirracistas no Brasil e no mundo, que, por sua vez, são fruto dos elementos que a camarada Ana Rocha sintetiza ao se referir às crises em que estamos imersas (os) e ao comportamento que o capital adota, de “… empurrar as mulheres para o espaço privado, responsáveis pelos cuidados, sem políticas públicas, dificultando a sua participação social e política”.

Em pleno acordo com os nove itens elencados sobre a Política de Quadros (PQ), reforçamos alguns e acrescemos outros.

1 – Fóruns Estaduais sobre a Emancipação das Mulheres (FEPEM’s).

Órgãos e instâncias partidárias, especialmente Comissões Políticas Estaduais e Executivas Estaduais, seja por fragilidade ou sobrecarga de pautas que exigem respostas imediatas, não dão conta de se debruçarem de forma perene em torno das tarefas de assimilar, desenvolver e difundir nossa elaboração sobre a questão da emancipação das mulheres. Isto trava a implementação de medidas que tratam da presença feminina na vida partidária.

A saída para resolver esta questão é a instalação e o funcionamento dos FEPEM’s. São neles que trataremos das pautas relacionadas à PQ específica para as mulheres. É por meio deles que conseguiremos institucionalizar a pauta no interior dos Comitês Estaduais, horizontalizá-la para o conjunto das frentes de massa, de estruturação partidária e de parcela dos Comitês Municipais e garantir que tudo seja executado com a transversalidade que tais fóruns irão permitir em função de suas composições.

2 – Alternância e funcionamento pleno das direções partidárias.

Em direções onde quadros se alternam com frequência nas diversas funções, as mulheres tendem a ter mais oportunidades de ocupar postos de destaque, dada a alta presença masculina neles. Ocorre o mesmo se as secretarias das direções possuírem funcionamento pleno e horizontal, constituindo e pondo para funcionar de modo regular as comissões auxiliares, de modo que seus membros tenham a oportunidade de contribuir com o processo de elaboração e execução do plano da pasta. Quanto mais coletivo e participativo for o dia a dia das direções, mais mulheres tendem a ser envolvidas.

3 – Formação descentralizada e abrangente.

O PCdoB tem uma densa e vasta elaboração teórica e política do feminismo emancipacionista, a qual não para de ser enriquecida, prova disto é o documento em debate. Convive atualmente com uma diversidade de teorias e elaborações do campo da luta feminista que, por estarem ocupando mais espaço e exposição nos pátios e nos programas de pós-graduação das universidades e nas redes sociais, acabam sendo mais difundidas que nossas ideias, inclusive entre nós mesmas (os).

Percebe-se que nosso partido está aberto para debruçar-se sobre estas novas teorias, o que significa aprender com elas, incorporar eventuais elementos e realizar a boa e velha luta de ideias.

A nova geração de feministas é e será formada em meio a este processo, de apreensão do conteúdo emancipacionista, mas também de amplo e intenso diálogo com outras teorias, num mundo de uma sociedade em rede, em que os mecanismos de informação são não apenas velozes, mas diversos e plurais.

Esta tarefa é urgente e precisa do envolvimento direto da geração que nos trouxe até aqui com muito êxito. Então, por que não um Projeto de Mentoria? Um projeto em que quadros da geração mais antiga sejam mentoras de quadros da nova geração, fundamentado no diálogo e compartilhamento de experiências. Um acompanhamento com centro no estudo e no aprendizado de modo corresponsável. Teríamos Ana Rocha, Jô Moraes, Julieta Palmeira, Liége Rocha, Mary Castro, Olívia Santana, Vanessa Grazziotin e tantas outras numa relação de mentoria com Carina Vitral, Flávia Calé, Keulinha, Nagila Maria, Rozana Barroso, dentre diversas outras. Pensemos nisto.

4 – Cadastrar os quadros femininos.

Paralelamente à pesquisa sobre o perfil das mulheres que se encontram na estrutura partidária, é preciso cadastrar os quadros femininos. Do contrário, a PQ não se realiza, dado que este banco de dados é sua matéria-prima.

Conhecer, estudar, classificar de forma sistemática, alocar, promover, realizar controle e avaliação do desempenho são componentes sistêmicos da PQ que só se realizam se os Departamentos Estaduais de Quadros (DEQ’s), junto com as Secretarias Estaduais de Mulheres, conseguirem erguer um banco de dados e, por meio dele, interagir e agir em conjunto com os demais membros dos FEPEM’s. A principal ferramenta já possuímos, o PCdoB-Digital, falta nos apropriarmos melhor dela.

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*Harlen Oliveira Cunha é economista, mestre em economia, militante da Unegro, coordenador do departamento estadual de quadros do PCdoB-BA e membro da coordenação do departamento nacional de quadros.

(BL)

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